Saúde Mental e Surfe: Como o esporte ajuda a lidar com estresse, ansiedade e promove o bem-estar ao surfe feminino

O som das ondas quebrando na praia, o contato com a água salgada, a sensação de deslizar sobre o mar. Para muitas mulheres, o surfe vai muito além de um simples esporte – é uma poderosa ferramenta de transformação para a saúde mental e o bem-estar emocional. Em um mundo onde a ansiedade e o estresse se tornaram quase epidêmicos, especialmente entre o público do surfe feminino, o surfe emerge como uma prática que combina atividade física, conexão com a natureza e fortalecimento de vínculos sociais, criando um efeito terapêutico único.

A ciência por trás das ondas: como o surfe afeta o cérebro feminino

Quando uma mulher entra no mar com sua prancha, uma série de processos neurológicos benéficos é desencadeada. Estudos científicos têm demonstrado que o contato com a água do mar, combinado com a atividade física e a necessidade de concentração total, cria o que os psicólogos chamam de “estado de fluxo” ou “flow state” – um estado mental de completa imersão e foco no momento presente.

“O surfe exige concentração total. Quando você está na água, esperando a onda perfeita, remando com força e finalmente se colocando de pé na prancha, não há espaço para pensamentos ansiosos ou preocupações do dia a dia”, explica a psicóloga esportiva Dra. Marina Santos, especialista em saúde mental feminina.

Esse estado de atenção plena funciona como uma forma de meditação ativa, reduzindo significativamente os níveis de cortisol (hormônio do estresse) e aumentando a produção de endorfinas, serotonina e dopamina – neurotransmissores associados à sensação de bem-estar e felicidade.

Depoimentos reais: quando o mar se torna terapia

A surfista profissional brasileira Tatiana Weston-Webb, que recentemente anunciou uma pausa na carreira para cuidar da saúde mental, é um exemplo de como mesmo atletas de elite reconhecem a importância do equilíbrio emocional. Em seu anúncio, Tatiana mencionou que, junto com sua psicóloga, identificou sinais de desgaste emocional e físico que poderiam resultar em burnout.

“Precisamos normalizar essas pausas para cuidar da saúde mental. O surfe me salvou em muitos momentos difíceis, mas também precisamos reconhecer quando é hora de descansar e se recuperar”, declarou a atleta.

Para Suelen Naraísa, bicampeã brasileira de surfe, o esporte foi fundamental durante os períodos de isolamento social. “No mar nos desconectamos de problemas. Podemos esvaziar a mente, como em meditação. Nossa atenção fica voltada para o ambiente e focada nos movimentos”, compartilhou a atleta, incentivando outras mulheres a buscarem o surfe como forma de autocuidado.

Os 5 principais benefícios do surfe para a saúde mental feminina

1. Redução significativa da ansiedade

O surfe combate a ansiedade de múltiplas formas: pela atividade física que libera tensões acumuladas, pela respiração controlada necessária durante a prática, pelo foco no momento presente e pela exposição gradual a situações desafiadoras – um processo semelhante à terapia de exposição utilizada por psicólogos no tratamento de transtornos ansiosos.

Para mulheres que enfrentam pressões sociais, profissionais e familiares simultâneas, essa redução da ansiedade pode significar uma melhora substancial na qualidade de vida.

2. Combate à depressão e melhora do humor

A combinação de exercício físico, exposição ao sol (importante para a produção de vitamina D) e o sentimento de conquista ao dominar uma nova habilidade faz do surfe um poderoso aliado contra sintomas depressivos.

“Quando consegui ficar em pé na prancha pela primeira vez, depois de várias tentativas, senti uma alegria que não experimentava há meses. Foi como se algo dentro de mim despertasse novamente”, relata Carla Mendes, 34 anos, que começou a surfar após um período de depressão pós-parto.

3. Prevenção do burnout

Em uma era onde o esgotamento profissional atinge especialmente as mulheres, que muitas vezes acumulam múltiplas jornadas, o surfe oferece uma desconexão completa das pressões diárias. A necessidade de estar totalmente presente no momento, sem celulares ou notificações, cria um intervalo genuíno na constante disponibilidade exigida pela vida moderna.

Estudos mostram que essa pausa regular, combinada com atividade física e contato com a natureza, é uma das formas mais eficazes de prevenir o burnout – como reconheceu Tatiana Weston-Webb ao decidir fazer uma pausa preventiva em sua carreira.

4. Fortalecimento da autoestima e da imagem corporal

Um dos aspectos mais transformadores do surfe para mulheres é a mudança na relação com o próprio corpo. No mar, o corpo não é valorizado pela aparência, mas pela força, equilíbrio, resistência e habilidade.

“Quando comecei a surfar, parei de me preocupar com celulites ou com o que os outros pensavam do meu corpo. Comecei a valorizar o que meu corpo podia fazer, como ele era forte e capaz”, conta Mariana Lima, 29 anos, integrante de um coletivo feminino de surfe em Florianópolis.

Essa ressignificação da relação com o corpo é especialmente importante em um contexto social que frequentemente impõe padrões estéticos irreais às mulheres.

5. Criação de comunidade e pertencimento

Os coletivos femininos de surfe têm se multiplicado pelo Brasil, criando espaços seguros onde mulheres podem aprender, evoluir e compartilhar experiências sem julgamentos ou pressões.

“Encontrar outras mulheres que compartilham a mesma paixão pelo surfe me deu uma sensação de pertencimento que eu não tinha em outros ambientes. Aqui não importa sua idade, profissão ou aparência – o que importa é a coragem de entrar no mar e tentar”, explica Débora Santos, 42 anos, fundadora de um grupo de surfe feminino no Rio de Janeiro.

Essa conexão social é um fator protetor fundamental para a saúde mental, especialmente para mulheres que muitas vezes enfrentam isolamento em diferentes fases da vida.

O poder dos coletivos femininos de surfe

O crescimento dos coletivos exclusivamente femininos de surfe representa uma revolução silenciosa nas praias brasileiras. Esses grupos não apenas ensinam técnicas de surfe, mas criam um ambiente de acolhimento e suporte mútuo que transcende o esporte.

“Quando uma mulher entra no mar pela primeira vez, ela não está apenas aprendendo a surfar – está desafiando medos, superando limites e descobrindo uma força interior que muitas vezes não sabia que tinha”, explica Fernanda Costa, instrutora de surfe especializada em aulas para mulheres.

Esses coletivos funcionam como verdadeiras redes de apoio, onde mulheres de diferentes idades, profissões e histórias de vida se encontram unidas pela paixão pelo mar. O impacto na saúde mental é significativo: redução da sensação de isolamento, aumento da autoconfiança e criação de vínculos genuínos baseados em experiências compartilhadas.

Surfe como meditação em movimento

Um dos aspectos mais poderosos do surfe para a saúde mental feminina é sua capacidade de funcionar como uma forma de meditação incorporada ou “embodied meditation”. Diferente da meditação tradicional, que pode ser desafiadora para pessoas com ansiedade ou dificuldade de concentração, o surfe oferece uma forma natural de alcançar o estado meditativo através do movimento.

“No surfe, você precisa estar completamente presente. Se sua mente divagar por um segundo, você pode perder a onda ou cair. Essa necessidade de presença total cria um efeito semelhante à meditação mindfulness, mas de uma forma que muitas mulheres consideram mais acessível e prazerosa”, explica a Dra. Santos.

Essa qualidade meditativa do surfe é particularmente benéfica para mulheres que enfrentam ruminação mental – o hábito de ficar revisitando preocupações e problemas repetidamente – um padrão cognitivo mais comum em mulheres e fortemente associado à ansiedade e depressão.

A teoria da “Blue Mind”

O conceito de “Blue Mind”, desenvolvido pelo biólogo marinho Wallace J. Nichols, ajuda a explicar por que o contato com o oceano tem um efeito tão profundo na saúde mental. Segundo esta teoria, a proximidade com a água induz um estado de calma meditativa que reduz o estresse e aumenta o bem-estar.

“Existe algo quase primordial na nossa conexão com a água. O som das ondas, o ritmo do oceano, a vastidão do horizonte marinho – tudo isso tem um efeito regulador no nosso sistema nervoso”, explica a neuropsicóloga Dra. Camila Ferreira.

Para mulheres surfistas, esse efeito é amplificado pela imersão física na água e pelo engajamento ativo com o oceano, criando uma experiência multissensorial que potencializa os benefícios para a saúde mental.

Surf therapy: quando o surfe se torna tratamento

O reconhecimento dos benefícios psicológicos do surfe levou ao desenvolvimento de programas estruturados de “surf therapy” – intervenções terapêuticas que utilizam o surfe como ferramenta para tratar condições como ansiedade, depressão, TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) e outros desafios de saúde mental.

No Brasil, iniciativas como o “Projeto Ondas de Cura” têm utilizado o surfe como parte do tratamento para mulheres que enfrentam transtornos de ansiedade, com resultados promissores. “Vemos melhoras significativas não apenas nos sintomas de ansiedade, mas também na autoestima, na qualidade do sono e na capacidade de enfrentar desafios em outras áreas da vida”, relata a psicóloga Renata Campos, coordenadora do projeto.

Estudos internacionais corroboram esses resultados, mostrando que programas de surf therapy podem ser particularmente eficazes para mulheres que enfrentaram traumas ou que não respondem bem às abordagens terapêuticas tradicionais.

Como começar: dicas para mulheres que querem experimentar os benefícios do surfe

Se você se interessou pelos benefícios do surfe para a saúde mental, aqui estão algumas dicas para começar:

1.Busque coletivos femininos: Procure grupos de surfe exclusivamente para mulheres em sua região. Esses ambientes costumam ser mais acolhedores para iniciantes.

2.Comece com aulas: Investir em algumas aulas com um instrutor qualificado pode acelerar seu aprendizado e tornar a experiência mais segura e prazerosa.

3.Não se compare: Cada pessoa tem seu próprio ritmo de aprendizado. O importante é sua jornada pessoal, não comparar seu progresso com o de outras surfistas.

4.Equipamento adequado: Use um wetsuit confortável e uma prancha apropriada para iniciantes. Equipamento inadequado pode tornar a experiência frustrante.

5.Respeite seus limites: Comece em condições de mar tranquilas e vá progredindo gradualmente conforme sua confiança aumenta.

6.Celebre pequenas vitórias: No surfe, cada pequeno progresso merece ser celebrado – seja ficar de joelhos na prancha pela primeira vez ou conseguir remar até passar a arrebentação.

7.Mantenha a regularidade: Os benefícios para a saúde mental são mais pronunciados quando a prática é regular, mesmo que seja apenas uma vez por semana.

Conclusão: muito além do esporte

O surfe oferece às mulheres muito mais que uma atividade física ou um hobby – proporciona uma jornada de autoconhecimento, superação e conexão. Em um mundo onde a saúde mental feminina enfrenta desafios únicos, o oceano se apresenta como um espaço de cura, liberdade e empoderamento.

Como resumiu a surfista e ativista Maya Gabeira: “O surfe me ensinou que sou mais forte e mais capaz do que jamais imaginei. Essa confiança transborda para todos os aspectos da minha vida.”

Para muitas mulheres, a verdadeira terapia está nas ondas – um lugar onde é possível, mesmo que temporariamente, deixar para trás as pressões, expectativas e demandas da vida cotidiana, e simplesmente ser. E talvez seja exatamente isso que torna o surfe tão poderoso para a saúde mental feminina: a redescoberta da alegria de existir plenamente no momento presente, em harmonia com a natureza e consigo mesma.


Este artigo foi elaborado com base em pesquisas científicas, depoimentos de surfistas e especialistas em saúde mental. As informações têm caráter educativo e não substituem o acompanhamento profissional para questões de saúde mental.

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